

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou no Diário Oficial da União, em 21 de novembro de 2025, a Portaria nº 1.423/2025, que cria o Comitê para Monitoramento e Avaliação do Plano de Ação para Tratamento das Filas. Com vigência inicial de 12 meses, prorrogável por mais 6 meses, mediante deliberação de seus membros. O Comitê será responsável pelo acompanhamento sistemático das ações voltadas à redução das filas regulatórias e à melhoria dos prazos de análise de petições, abrangendo todos os produtos e serviços sujeitos à vigilância sanitária, conforme o § 1º do art. 8º da Lei nº 9.782/1999.
A normativa, proveniente do Tema nº 4.2 da Agenda Regulatória 2024/2025, reflete um esforço da Anvisa de responder a um problema estrutural que compromete a efetividade do sistema regulatório sanitário: a incapacidade de processar, em prazo razoável, o volume crescente de petições submetidas. A medida se insere em um cenário de demandas por maior previsibilidade regulatória, mas evidencia simultaneamente, a fragilidade histórica na gestão de estoques processuais.
O colegiado reúne representantes das cinco Diretorias da Anvisa e prevê, de forma condicionada à pauta, a participação de entidades do setor regulado, formalizando um canal entre a Agência e os atores diretamente afetados pela regulação sanitária. Entretanto, a opção por um comitê temporário suscita questionamentos sobre a adequação da resposta ao problema enfrentado; filas regulatórias de grande magnitude não decorrem apenas da falta de monitoramento estruturado, mas sim de limitações ligadas ao déficit de pessoal especializado, à complexidade técnica dos produtos regulados e ao acúmulo de obrigações normativas que não são periodicamente revisadas. Nesse sentido, o Comitê pode ser interpretado como uma resposta paliativa e de curto prazo, cuja efetividade dependerá da implementação de medidas que extrapolam o escopo da própria Portaria.
Algumas medidas já estão em curso, e a Dicol anunciou, em 7 de novembro de 2025, ações estruturantes e emergenciais para otimizar as filas, incluindo reforço da força de trabalho, inovação tecnológica (IA) e ajustes procedimentais. Embora a Agência projete normalizar o passivo em um ano, essa meta depende de execução coordenada e de mudanças mais profundas. O pacote combina avanços relevantes, mas ainda reflete respostas fragmentadas a um problema maior: iniciativas como reliance, força-tarefa, agrupamento de análises e automação aliviam o estoque no curto prazo, mas não enfrentam os gargalos históricos ligados à complexidade técnica, à sobrecarga normativa e à falta de planejamento contínuo. Assim, apesar do movimento positivo, sua eficácia duradoura exige reformas mais amplas e maior compromisso com transparência, previsibilidade e governança regulatória.
Apesar da criação do Comitê apresentar avanços, é importante a criação de parâmetros vinculantes para sua atuação, como metas, mecanismos de responsabilização e regras de transparência em um cenário de judicialização crescente.
Para o setor regulado, a Portaria pode representar um mecanismo relevante de redução de riscos regulatórios, ainda que de forma potencial e não garantida. A abertura, mesmo condicionada, para contribuições do setor privado amplia a possibilidade de identificar gargalos técnicos, apontar falhas procedimentais e questionar critérios não explicitados de priorização, sobretudo
em áreas em que a própria Agência reconhece dificuldades, como dispositivos médicos de alta complexidade, terapias avançadas e avaliação de novas tecnologias.
Em síntese, a Portaria nº 1.423/2025 representa mais um capítulo na tentativa de enfrentar entraves históricos na gestão da fila processual. Entretanto, o ato normativo carece de densidade institucional para produzir mudanças transformadoras, com seu êxito dependendo da articulação com medidas mais amplas: revisão do arcabouço normativo, fortalecimento da capacidade técnica, modernização de sistemas e estabilização de fluxos internos. Enquanto isso não ocorrer, a Portaria tende a operar como instrumento auxiliar dentro de uma estrutura que ainda necessita de reformas mais profundas para assegurar segurança jurídica, eficiência administrativa, previsibilidade e proteção sanitária compatíveis com os desafios regulatórios contemporâneos.